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segunda-feira, 28 de maio de 2012

Crônica de um amigo


CADA SEGUNDO PASSADO É TEMPO PERDIDO



Para Leonardo Barros,
Para mim,
E para todos aqueles que são como nós

De minuto a minuto Jonas perdia-se no tempo. Rasgava sorrisos sem qualquer esperança no meio das calçadas. Havia ânsia em conhecer um novo mundo, em viver uma nova vida; e havia ânsia também em morrer. Não dissipar-se, mas dissipar a dor de ver um amor partindo pela porta da frente, levando-lhe pedaços embora e deixando o resto em frangalhos.
O sol, entre levantar-se e pôr-se, trazia um calor raro. Um calor que não tinha forças em aquecer a alma. Quê mais se pode esperar de alguém que depositou uma vida toda em uma outra pessoa e foi esquecida num envelope de cartas?
A voz ia sumindo da cabeça de Jonas. Seu ex-namorado parecia estar bem pelas notícias que chegavam. Festas, bebidas, luzes. Ele pensava: onde estão as cores? E era óbvia sua apatia em relação ao resto do mundo. A antiga alegria resumia-se em correr os corredores gelados e em chorar lágrimas de lâmina ácida, que ardiam ao saltar dos olhos. Quê mais se pode esperar das alegrias tantas da vida? São preços a serem pagos. Momentos felizes, Jonas pagava com lágrimas de lâmina ácida.
As noites juntos, as cartas, as promessas, o tempo gasto, onde estava tudo isso? Tudo isso estava num buraco explosivo e (às vezes) furtivo chamado memória. Essa mesma memória que nos faz sorrir, em alguns momentos tende a nos partir em duas partes de um mesmo resto de ser humano. Jonas sentia-se assim: partido em dois. Uma metade que seguia em frente com a cabeça erguida, e outra, estática, muda, anestesiada, buscando por paliativos envolventes. Jonas estava, de fato, envolvido! Envolvido pela ânsia de nunca ter perdido tanto tempo ao lado daquele homem tão grande e ao mesmo tempo tão pequeno, ao lado daquele homem tão maduro e ao mesmo tempo tão infantil, ao lado daquele que o fez sentir-se tão amado e ao final, saiu pela porta da frente carregando-lhe a paz e a alma.
Em dias de chuva, parado na janela do quarto, com um cigarro enfiado no meio dos dedos e com os olhos perdidos lá fora ele sentia-se um nada, porque é isso que o abandono faz com a gente. Como se nunca tivesse significado coisa alguma para aquele seu ex.
- Sou um nada, fui um nada e serei um ninguém!
Em dias de sol, ele caminhava com sua cadela pelas ruas estreitas e sufocantes. Saia também com alguns amigos, mas seu humor era sério. Todo encurvado, envergado ao máximo, com as olheiras no máximo, com aquele sorriso de elástico que estiva e voltava ao mesmo lugar numa fração de segundos.
- Não se pode perder tempo com sorrisos!
Muito tempo havia sido perdido com sorrisos que findaram em lágrimas de lâmina ácida.
E como pode ter perdido tanto tempo fazendo planos de casamento?
Ali, a única coisa que faltava era alguém que lhe conhecesse os suspiros, os olhares, para num abraço fraterno dizer-lhe que sabia o que estava acontecendo, mas que aquilo passaria e que as lágrimas de lâmina ácida uma hora deixariam de escorrer-lhe as faces. Então Jonas chorava, porque ultimamente vinha se sentindo tão sozinho, e ninguém ouvia o clamor, ninguém via que ele não queria se esquecer, mesmo as memórias fazendo-lhe tão mal...
- Não, não vou me entregar! - ele dizia para si mesmo enquanto vestia-se para uma festa.
E a partir daquele dia, ele sabia que tudo passaria e estaria de cabeça erguida até que a última lágrima de lâmina ácida saísse e lhe libertasse da angústia da distância.
E o tempo se arrastava, de janeiro a dezembro, sempre passando por abril e por novembro. Aos poucos o coração ia voltando ao compasso natural. Aos poucos o sorriso ia voltando ao brilho contagiante. E não foi de uma hora para a outra! Entre o ruir da vida e o reconstruir da vida, muitas lágrimas de lâmina ácida lhe cortaram o rosto.
E também não posso enganar dizendo que ele não se lembra mais. Lembra sim! Mas de coração, são lembranças, memórias! Não de um tempo perdido, porque foi bom enquanto durou, mas de um tempo que ainda corre nas veias de Jonas, fazendo-lhe quem hoje ele é. Confesso que um dia por mês ele ainda lembra, mas sorri!
Tempo perdido é o tempo que a gente passa fantasiando e deixando de viver...


Rafael Pereira,
Regente Feijó
28/05/2012 - 03:30

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